Advogado de fazendeiro, suposto mandante da morte de Dilma Silva, diz que prisão foi precipitada

Por Amazônia Real Publicado em: 01/04/2019 às 20:50

O advogado Cândido Lima Júnior disse, em entrevista, que pediu a revogação da prisão do fazendeiro Fernando Rosa Filho, que cumpre prisão temporária em Novo Repartimento (Foto: Pedrosa Neto/Amazônia Real)

Kátia Brasil e Pedrosa Neto, da Amazônia Real

Manaus (AM) e Belém (PA) – O advogado criminal Cândido Lima Júnior, 37 anos, é o responsável pela defesa do fazendeiro Fernando Ferreira Rosa Filho, que foi apontado pela Polícia Civil do Pará como sendo o suposto mandante de seis assassinatos em Baião, nordeste do estado do Pará. Entre eles, está o da coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Dilma Ferreira da Silva, entre os dias 21 e 22 de março, em sua casa, no assentamento Salvador Allende. Em entrevista à agência Amazônia Real, o advogado disse que pediu, na Justiça, a revogação da prisão temporária (30 dias) do fazendeiro, que alega ser inocente das acusações atribuídas a ele.

“Até onde consta, é uma prisão que foi dada de forma um pouco precipitada, mas que nós estamos muito tranquilos, tendo em vista que foi uma prisão temporária. É uma prisão que tem duração até 30 dias, porque é uma prisão investigativa. Nós estamos tentando revogar diante do que nós temos”, disse Cândido, ressaltando que o pedido de liberdade será encaminhado à Comarca de Novo Repartimento e ao Tribunal de Justiça do Pará, em Belém.

O fazendeiro Fernando Rosa Filho, 43 anos, está preso temporariamente (por 30 dias), desde o dia 26 de março, em uma cela da Delegacia da Polícia Civil, em Novo Repartimento, no sudeste do Pará, próximo a Tucuruí. Ele é considerado o suposto mandante de seis mortes: a da líder Dilma Ferreira Silva, do marido dela, Claudionor Amaro Costa da Silva, e do vizinho do casal, Milton Lopes. Os três foram assassinados por seis homens, no assentamento Salvador Allende, dizem testemunhas. Os autores do crime amordaçaram e esfaquearam as vítimas. Há suspeita de que a ativista tenha sido estuprada e torturada, como apontam as investigações.

Na fazenda de propriedade de Fernando Filho, comerciante do ramo de supermercado e hotelaria, também conhecido como “Fernandinho Shalon”, os seis homens também mataram o casal de caseiros Marilete da Silva Oliveira e Raimundo de Jesus Ferreira, assim como o tratorista Vanilson da Silva Santos, conforme diz a polícia. Contudo, essas vítimas foram carbonizadas.

Ao divulgar a prisão do mandante dos crimes, a Polícia Civil apresentou, apenas quatro dos seis acusados: os irmãos Alan, Cosme Francisco, Glaucimar e Marlon Alves. Nesta segunda- feira (1º.), a Polícia Militar apresentou Cosme Francisco, mas não informou onde ele foi capturado, pois estava foragido. Seus outros três irmãos continuam sendo procurados pela polícia.

Testemunhas do assentamento Salvador Allende suspeitavam que a morte de Dilma Silva teria sido motivado por violência contra a mulher ou vingança. O MAB levantou a suspeita de conflito agrário e um recado para todas as lideranças do movimento no Pará. A família da ativista diz que ela não relatou ameaças de morte.

Fernando Ferreira Rosa Filho (Foto: Polícia Civil)

O motivo da morte de Dilma, segundo a Polícia Civil, seria o interesse do fazendeiro Fernando Rosa Filho pelas terras do lote em que ela foi assentada em 2012, pelo governo federal, depois que foi atingida pelas obras da hidrelétrica de Tucuruí. A fazenda está distante da casa a 14 quilômetros, onde o fazendeiro teria planejado a construção de uma pista clandestina para ser usada pelo tráfico de drogas. Ele não queria ter uma ativista do movimento agrário por perto; daí mandou executá-la, conforme a investigação. Já as mortes dos três funcionários do fazendeiro teria como motivação uma possível ação trabalhista e pagamento de salários.

Como esse tipo de conflito agrário virou um padrão no Pará, e para evitar mais uma impunidade, o escritório para a América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas (ONU) cobrou uma investigação completa do governo de Helder Barbalho (MDB). Leia a entrevista com o advogado a seguir:

Amazônia Real – Qual foi a reação do fazendeiro Fernando Ferreira Rosa Filho ao receber a ordem de prisão, como sendo o suposto mandante de dois crimes, em distintos locais de Baião, no nordeste do Pará?

Cândido Lima Júnior – Foi com surpresa, porque ele fez o Boletim de Ocorrência dos três primeiros [os funcionários assassinados na fazenda]. E, também, ele não tinha nenhum contato com a outra vítima [Dilma Ferreira Silva]. Não tinha relação de processo com ela. O terreno da outra vítima (Dilma) está distante da fazenda. Não havia interesse do Fernando em nenhuma das mortes.

Amazônia Real – A Polícia Civil afirma que o fazendeiro é o suposto mandante das mortes dos funcionários da fazenda. O motivo seria evitar uma ação trabalhista. O que o seu cliente diz sobre essa acusação?

Cândido – Essa questão de colocar direito trabalhista não existe. Um funcionário trabalhava há dois meses e o outro há um mês. Então, não geraria um direito trabalhista que justificasse um ato desse. Quando aconteceu lá [as mortes na fazenda], foi feita a oitiva [depoimento] dele [do fazendeiro]. Foi feito a oitiva da família [mulher e mãe do fazendeiro] a priori.

Amazônia Real – Quando a família do fazendeiro foi ouvida?

Cândido – Houve um mandado de busca e apreensão na casa dele [na cidade de Repartimento]. A família foi levada à delegacia para ser ouvida: a esposa, a irmã e a mãe [do fazendeiro].

Amazônia Real – O governador Helder Barbalho (MDB) anunciou, em um vídeo, dizendo que a prisão do fazendeiro servia como exemplo para virar a página dos crimes que ficam impunes no estado do Pará. Como a família do fazendeiro recebeu esse anúncio?

Cândido – Bom, o que eu vi da mensagem do governador, o que tive acesso, só diz que a polícia estava dando uma resposta. A prisão do Fernando é uma prisão cautelar, uma prisão temporária de 30 dias; é meramente investigativa. Não é uma prisão preventiva. Então, a polícia está fazendo o papel dela: a função de investigar o que houve. Nós nos colocamos à disposição da justiça para ajudar, como o Fernando já vinha ajudando nas investigações. Todas as informações que são pedidas, são repassadas. Então, assim, o governador endossou a investigação. Por enquanto é o temos. Até porque ninguém pode ser condenado sem o processo legal. Por enquanto, o Fernando é um investigado; ele não é um condenado como a mídia está colocando.

Amazônia Real – Mas não foi a mídia que está divulgando informações oficiais e a foto do fazendeiro Fernando na internet como mandante dos crimes, mas a notícia foi postada pelo governador Helder Barbalho na rede social da internet. Faltou cuidado ao expor a foto e acusar seu cliente? Como o senhor avalia esse impacto?

Cândido – Na verdade, estamos falando de um problema de cunho nacional [exibição de fotos de acusados]. Não é um problema que só aconteceu com o Fernando: a gente se depara com ele diariamente. Nós estamos falando de uma mídia mais forte, não é aquela mídia de Facebook, aquela é feita pela própria sociedade, que já incrimina. Então, é um procedimento natural [do governador] de ocorrer. O importante é que todos nós tenhamos a compreensão e dignidade se por acaso errar. O importante no momento é a gente provar que o Fernando não teve participação nenhuma no evento [os crimes]. Estamos aqui para ajudar a polícia a conseguir as provas suficientes para colocar quem fez esse crime na cadeia.

Dilma Ferreira Silva ao lado da então presidenta Dilma Rousseff (PT) em Audiência das atingidas por barragens no Palácio do Planalto, em Brasília em 07 de abril de 2011 (Foto: Leandro Silva/MAB)

Amazônia Real – Em relação ao seu cliente, o que ele disse para o senhor sobre essas duas acusações: o triplo homicídio na fazenda e um triplo homicídio na casa da Dilma? Quais foram as palavras que ele disse para o senhor?

Cândido – Na verdade, a alegação é de inocente. Ele realmente não tinha nada a ver. Sei que é complicado para mim, enquanto advogado de defesa; ele é o meu cliente, mas ainda não foi nos apresentado nenhuma prova que, até o momento, mude esse conceito de que ele realmente é inocente.

Amazônia Real – O fazendeiro diz que é inocente nos dois crimes?

Cândido – Ele alega a inocência.

Cosme Francisco Alves foi preso pela Polícia Militar (Foto: PM)

Amazônia Real – A Polícia Civil diz que há indícios de contatos dos quatro executores, que estão foragidos, com Fernando. Ele conhece esses executores dos crimes? Em algum momento fez algum negócio com eles?

Cândido – Realmente todas as vezes que a senhora me perguntar sobre os outros acusados, vou dizer: eu não sei. Eu não sei ainda o que a polícia diz. Não tive acesso os autos.

Amazônia Real – O senhor não teve acesso ao inquérito?

Cândido – Ainda não.

Amazônia Real – O inquérito está em sigilo?

Cândido – Na verdade, o delegado superintendente que está à frente do caso nos garantiu o acesso aos autos [do inquérito]; estamos aguardando, foi prometido. Então, assim, nós estamos fazendo uma investigação particular, no sentido de tentar colaborar com a polícia, arregimentando pessoas que possam ajudar e até buscar novos fatos.

Amazônia Real – Essa investigação independente é custeada pela família? Quem participa dela?

Cândido – Na verdade, são os próprios amigos dele [Fernando]. Não é uma investigação a grosso modo. São os amigos que querem ajudar.

Amazônia Real – Como o senhor classifica a prisão do fazendeiro Fernando Rosa Filho, diante desses indícios que a polícia levantou e a declaração dele de que é inocente?

Cândido – O que motivou a prisão dele está lá nos autos [do inquérito], coisa que não tive acesso ainda. Eu não posso comentar nesse momento, porque eu não tenho acesso aos autos. Até onde consta, é uma prisão que foi dada de forma um pouco precipitada, mas que nós estamos muito tranquilos, tendo em vista que foi uma prisão temporária. É uma prisão que tem duração até 30 dias porque é uma prisão investigativa. Nós estamos tentando revogar a prisão diante do que nós temos.

Casa de Dilma Ferreira, com presença da Polícia Civil e de membros do MAB (Foto: Pedrosa Neto/Amazônia Real)

Amazônia Real – A Polícia Civil acusa o fazendeiro Fernando Rosa Filho de ser conhecido da polícia na região, por ter suposto envolvimento em outros crimes, entre os quais homicídios, agiotagem, tráfico de drogas e intimidações. O que o senhor tem a dizer acerca dessas acusações?

Cândido – Ele só tem um processo na justiça, que foi de um acidente de barco [fluvial]. Três pessoas morreram. Ele foi denunciado em março por homicídio culposo, que não tem a intenção [de matar].

Amazônia Real – O que o senhor espera da investigação das seis mortes em Baião?

Cândido – Quero deixar bem claro que acreditamos na Justiça, acreditamos na Polícia do Estado do Pará, da responsabilidade que ela tem para apurar e isso envolve vítimas. Estamos confiantes que a polícia fará um bom trabalho sem prejuízos aos inocentes.

O que diz a Polícia Civil?

Marcas de Sangue das vítimas no chão da casa de Dilma (Foto: Pedrosa/Amazônia Real) Neto/Amazônia Real)

A agência Amazônia Real procurou a assessoria da Polícia Civil do Pará para comentar as declarações do advogado Cândido Lima Júnior, que defende o fazendeiro Fernando Ferreira Rosa Filho.

Em nota, a Polícia Civil informou que “mantém todas as informações que repassou oficialmente a respeito das investigações dos crimes”.

“As ordens de prisão têm prazo legal de até 30 dias, a partir do dia do cumprimento dos mandados. Esse prazo, a Polícia Civil terá para correr atrás de mais elementos comprobatórios para requerer ao Judiciário a conversão da prisão temporária em prisão preventiva contra o fazendeiro e quatro acusados de serem os executores”, destacou a polícia.

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Reportagem Noticiosa

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