Questão Agrária

Antropólogo diz que negros encontraram a liberdade no Tambor

ELAÍZE FARIAS, DE NOVO AIRÃO (AM) A reportagem da agência Amazônia Real conversou com o antropólogo Emmanuel de Almeida Farias Júnior, pesquisador do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e autor do livro “Do […]

O antropólogo Emmanuel de Almeida Farias Júnior, autor do livro “Do rio dos Pretos ao Quilombo do Tambor”. (Foto: Arquivo pessoal).

Por Amazônia Real Publicado em: 05/11/2014 às 17:02

ELAÍZE FARIAS, DE NOVO AIRÃO (AM)

A reportagem da agência Amazônia Real conversou com o antropólogo Emmanuel de Almeida Farias Júnior, pesquisador do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e autor do livro “Do Rio dos Pretos ao Quilombo do Tambor”. Ele foi um dos coordenadores das oficinas de mapa em Novo Airão para moradores do Tambor e para as famílias que haviam deixado o Jaú. Os mapas ajudaram a dar referência territorial para a futura delimitação do Tambor. O passo seguinte foi acionar o Incra para iniciar os procedimentos de reconhecimento territorial, finalizados em 2009.

Aldinete Cardoso de Andrade, 25 anos, moradora da comunidade quilombola do Tambor. (Foto: Elaíze Farias/AR)

Amazônia Real – Como se deu o processo de conscientização da comunidade do Tambor?

Emmanuel de Almeira Farias Júnior – A mobilização étnica referente a luta dos quilombolas do Tambor e de Novo Airão foi para fazer frente ao processo de expropriação de seus territórios tradicionalmente ocupados. Desde o cerceamento do rio Jaú pelos limites do Parque Nacional do Jaú, os quilombolas e ribeirinhos foram submetidos a um cruel processo de exclusão social, sobrevivendo com o mínimo. As práticas agrícolas e extrativistas passaram a ser criminalizadas. Assim como a caça e a pesca. No início da implantação do Parque Nacional do Jaú PNJ), quilombolas e ribeirinhos foram submetidos a violências físicas e simbólicas.

Amazônia Real – Como ocorreu este momento de organização?

Farias Júnior – Esse momento é muito importante para os quilombolas, pois a reivindicação da identidade enquanto remanescentes de quilombos freou a violência, mesmo que simbólica, por parte do órgão que administra o PNJ. A reivindicação enquanto remanescentes acrescenta outros aliados quanto a reivindicação territorial, como a Fundação Cultural Palmares, o Incra, dentre outros.

Amazônia Real – Como se dá a resistência das famílias do Tambor pela permanência no local?

Farias Júnior – As famílias que permaneceram no rio Jaú articularam a Associação dos Moradores Remanescentes de Quilombo da Comunidade do Tambor. Tal ato freou o processo de deslocamento compulsório promovido pelo Estado através da agência ambiental que administra o PNJ. A partir da mobilização étnica, os quilombolas buscaram parcerias com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Novo Airão (STRNA), com a CPT (Comissão Pastoral da Terra) e com a universidade pública, através do laboratório de pesquisa Nova Cartografia Social da Amazônia/Universidade Federal do Amazonas, com apoio da Fundação Ford.

Amazônia Real – O que é uma comunidade quilombola nos dias de hoje?

Farias de Almeida – O conceito de quilombo histórico remete a luta contra escravidão, ou seja, a fuga das senzalas, das casas grandes, das plantações e das criações. A noção histórica foi forjada a partir de leis monarquistas, onde a fuga de escravos era crime. A noção histórica de quilombo não corresponde às realidades empiricamente observáveis, mesmo nos chamados quilombos históricos constituídos a partir da fuga, como no caso de Oriximiná-Pará.

Amazônia Real – Como são os quilombos da Amazônia?

Farias Júnior – Na Amazônia, encontramos uma diversidade de situações designadas quilombos que se constituíram a partir de experiências distintas. Como podemos observar nas pesquisas de Alfredo Wagner (antropólogo coordenador do PNCSA), em Alcântara (MA), temos as chamadas “terras de santo”, onde os ex-escravos se apropriaram das terras de ordens religiosas. O historiador Marco Teixeira mostra que na fronteira dos Estados de Rondônia e Mato Grosso, quando esgotaram os “campos d’ouro” quem abandonou a terra foram os “bandeirantes” deixando os seus escravos na região. A partir daí se constituem os quilombos do Guaporé. Outra situação é propriamente o quilombo do Tambor, onde homens e mulheres foram expulsos das zonas canavieiras, das grandes plantações e criações e passaram a perambular pelo interior do Brasil. Na Amazônia, tais situações descritas como quilombo são geralmente marcadas por designações locais, como “rio dos pretos”, “lago dos pretos”, “pretos carvoeiros”, “lago dos macacos”, “lago dos africanos”, são assim estigmatizados, que marca objetivamente uma distinção.

Amazônia Real – Como o quilombo do Tambor é caracterizado?

Farias Júnior – São descendentes de negros que buscaram uma vida autônoma e livre, sem se submeter a condições degradantes de trabalho nas grandes plantações no pós-abolição. Procuraram ficar longe de qualquer forma de trabalho compulsório com a força de trabalho imobilizada por um patrão ou senhor. Antes de ir para o Jaú, foram para os seringais do Acre, onde não permaneceram devido acharem o trabalho do seringueiro análogo ao trabalho escravo. Foram então para o Jaú.

Rakely de Oliveira Nascimento, 5, filha de Sabino dos Santos Nascimento, descendente dos primeiros quilombolas. (Foto: Elaíze Farias/AR)

Reportagem Noticiosa

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