Philip M. Fearnside

Parque Nacional da Serra do Divisor ameaçado: 2 ‑ O Parque

Por Diogo Mitsuru Koga, Irving Foster Brown, Philip M. Fearnside, David S. Salisbury e Sonaira Souza da Silva Área de estudo O Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD) (Figura 1) compreende 837.599 ha nos municípios de Cruzeiro do Sul, […]

Por Amazônia Real Publicado em: 19/05/2022 às 12:15

Por Diogo Mitsuru Koga, Irving Foster Brown, Philip M. Fearnside, David S. Salisbury e Sonaira Souza da Silva

Área de estudo

O Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD) (Figura 1) compreende 837.599 ha nos municípios de Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves, Marechal Thaumaturgo e Porto Walter. Esta área representa 5,5% do estado do Acre e estende-se junto com a fronteira peruana no sudoeste da Amazônia brasileira.

Figura 1. Localização e limites do Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD)

Mapeamento da mudança de uso da terra entre 1988 e 2018

O mapeamento do uso da terra foi realizado utilizando imagens de satélite Landsat 5 TM (Thematic Mapper) e Landsat 8 OLI (Operational Land Imager) acessadas no site do USGS (US Geological Service). As cenas utilizadas foram 05-66, 06-66 e 06-65 dos anos de 1988 (um ano antes da criação oficial do PNSD), 2003 (14 anos após a criação do PNSD, metade do período de análise de 30 anos) e 2018 (final do período de análise de 30 anos, situação atual) (Tabela 1). As datas das imagens foram escolhidas com a menor cobertura de nuvens possível (< 20%) durante junho a setembro.

Tabela S1. Imagens de satélite usadas

Para mapear a cobertura da terra, utilizou-se a classificação supervisionada MaxVer no software ARCGIS, que se baseia na ponderação das distâncias entre as médias dos níveis digitais das classes com base em amostras. Foram utilizadas as bandas do vermelho, infravermelho próximo e infravermelho de ondas curtas, fundidas com a banda pancromática, aplicando a técnica de Gram-Schmidt para obter uma resolução espacial de 15 m. Esta fusão de bandas foi utilizada apenas para o ano de 2018, uma vez que o Landsat 5 TM não possui as bandas pancromática e duas das bandas de infravermelhos, e exclusivamente para efeitos de visualização e ajuste dos resultados da classificação supervisionada.

As classes de uso e cobertura da terra consideradas neste estudo foram adaptadas dos estudos de Almeida e colaboradores [1] e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [2]. As classes foram: desflorestamento (D: áreas desmatadas que ocorreram no ano da imagem classificada, incluindo apenas a derrubada de floresta primária, excluindo vegetação secundária), mosaico de usos (MU: áreas caracterizadas por múltiplas coberturas da terra – p. ex. agricultura familiar praticada em conjunto com a pecuária tradicional), vegetação primária (VP: florestas sem alteração significativa de sua estrutura original), vegetação secundária (VS: vegetação proveniente de processos de sucessão natural após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais ), pastagem (P: vegetação plantada para pastagem de gado composta por forrageiras perenes), corpos d’água (CA: acumulações de água, como rios, córregos e lagoas), outros (O: áreas não cobertas por outras categorias, como afloramentos rochosos ou serranos, bancos de areia e estradas) e área não observada (NO: áreas com nuvens ou sombras de nuvens no momento da passagem do satélite).

Análise

Precisão do mapeamento do uso da terra

A precisão do mapeamento da mudança de uso da terra foi baseada no índice Kappa, que estima a concordância entre o mapeamento e as observações de campo [3]. Os dados de referência utilizados para avaliar o grau de precisão dos resultados foram obtidos por amostragem de campo com um drone (DJI Remotely Piloted Aircraft, Dà-Jiāng Innovations Science and Technology Co.). Devido à difícil acessibilidade e dimensão do PNSD, o parque mais ocidental do Brasil, os 413 pontos foram coletados e georreferenciados, onde o rio Juruá forma aproximadamente 200 quilômetros de fronteira do parque, usando um receptor do Sistema de Posicionamento Global de 6 a 14 de novembro de 2018 (Figura 2).

Figura 2. Localização das amostras (fotos aéreas) coletadas com o drone DJI Spark.

Padrões de uso da terra

Analisamos os padrões de uso da terra para os anos de 1988, 2003 e 2018 no PNSD e dentro de um buffer de 5 km dos limites do parque (zona de entorno definida para capturar a influência do PNSD através de sua principal via de acesso, o Rio Juruá, e a ocupação em suas margens), excluindo a fronteira com o Peru. Uma zona de 5 km foi escolhida para análise para capturar a área mais próxima e, portanto, mais semelhante ao interior do parque. A área de cada classe de uso da terra foi calculada para todos os anos analisados dentro e fora do PNSD. As perdas percentuais de cobertura florestal dentro e fora do PNSD foram calculadas para entender a eficácia do PNSD na manutenção da floresta. Construímos uma matriz de transição uso/cobertura da terra ao longo de três décadas para entender os principais usos que substituíram a floresta ao longo do tempo.

Avaliação de mapeamento

Embora 1% da área florestal tenha sido perdida antes de 1988, entre 1988 e 2018 o Parque Nacional da Serra do Divisor perdeu adicionalmente mais 1% de sua cobertura florestal nativa (Figura 3, Tabela 2). A avaliação da classificação supervisionada para o ano de 2018 indicou uma acurácia geral de 91,5% em relação aos pontos coletados em campo (do total de 413 amostras, 378 foram classificadas corretamente) e o índice Kappa atingiu 89,3% (≥ 81% indicam boa concordância) (Tabela 3). [4]

Figura 3. Uso e cobertura da terra em 1988, 2003 e 2018 dentro e ao redor do PNSD

Tabela 2. Matriz de transição entre classes de uso e cobertura da terra de 1988 a 2018 no PNSD

Tabela 3. Matriz de confusão baseada na imagem de 2018. A diagonal principal (valores em negrito)
corresponde a amostras corretamente classificadas

A imagem que abre este artigo mostra a Serra do Divisor, no Acre, em uma perspectiva aérea (Foto: Acre ao Vivo/Divulgação)

Notas

[1] Almeida CA, Coutinho AC, Esquerdo JCDM, Adami M, Venturieri A, Diniz CG, Dessay N, Durieux, L & Gomes, AR (2016) High spatial resolution land use and land cover mapping of the Brazilian Legal Amazon in 2008 using Landsat-5/TM and MODIS data. Acta Amazonica 46: 291–302.

[2] IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). (2013) Manual técnico de uso da terra, 3º ed.. IBGE, Rio de Janeiro, RJ.

[3] Meneses PR, Almeida T (2012) Introdução ao processamento de imagens de sensoriamento remoto. Universidade de Brasília, Brasília, DF.

[4] Este texto é uma tradução de: Koga, D.M., I.F. Brown, P.M. Fearnside, D.S. Salisbury & S.S. da Silva. 2022. Serra do Divisor National Park: A protected area under threat in the southwestern Brazilian Amazon. Environmental Conservation

Leia o primeiro artigo da série:

Parque Nacional da Serra do Divisor ameaçado: 1‑ Resumo da série

Sobre os autores

Diogo Mitsuru Koga possui graduação em Ecologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2010) e mestrado em Gestão de Áreas Protegidas da Amazônia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (2019). Atualmente é Analista Ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), lotado no Núcleo de Conciliação Ambiental – Tocantins. Foi gestor e chefe substituto do Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD) – Acre, entre 2010 e 2019.

Irving Foster Brown possui graduação da Amherst College (1973) e mestrado (1979) e doutorado (1981) em ciências geológicas na Northwestern University. Atualmente é pesquisador do Woodwell Climate Center vinculado à Universidade Federal do Acre. Tem experiência na área de Geoquimica e Ecologia, com ênfase em Ecologia Aplicada, atuando principalmente nos seguintes temas: mudanças globais, queimadas, sensoriamento remoto, estimativas de desmatamento, uso de florestas, metodos de verificação do uso da terra.

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 700 publicações científicas e mais de 600 textos de divulgação de sua autoria que podem ser acessados aqui.

David S. Salisbury é Professor Associado de Geografia e Meio Ambiente na University of Richmond, Richmond, Virginia, EUA. É Professor Honorário na Universidad Nacional de Ucayali, Peru. Fez graduação em literatura espanhola no Middlebury College, mestrado em estudos latino-americanos na University of Florida e doutorado em geografia na University of Texas. Publicou diversos trabalhos sobre mudança do uso da terra na Amazônia peruana e no Acre.

Sonaira Souza da Silva é formada em Engenharia Agronômica (2008), Mestrado em Produção Vegetal com ênfase em agricultura familiar (2010) pela Universidade Federal do Acre e Doutorado em Ciências de Florestas Tropicais (2017) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Atualmente é professora da Universidade Federal do Acre Campus Floresta em Cruzeiro do Sul, onde atua como orientadora no Programa de Pós-graduação em Ciências Ambientais e Coordena o Laboratório de Geoprocessamento Aplicado ao Meio Ambiente (LabGAMA). Desenvolva pesquisas focadas em análises espaciais do uso da terra, queimadas e incêndios florestais na Amazônia.

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Sobre a matéria

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