A Amazônia segundo Lúcio Flávio Pinto

O maior vendedor de terras do Brasil

Em abril de 2010, o Iterpa (Instituto de Terras do Pará) arrecadou a área de terras denominada gleba Ampulheta-Área 1, localizada no município de Parauapebas, no sul do Estado, com área de 23.614 hectares, devidamente matriculada no cartório de registro […]

Por Lúcio Flávio Pinto Publicado em: 04/07/2022 às 16:16

Em abril de 2010, o Iterpa (Instituto de Terras do Pará) arrecadou a área de terras denominada gleba Ampulheta-Área 1, localizada no município de Parauapebas, no sul do Estado, com área de 23.614 hectares, devidamente matriculada no cartório de registro de imóveis da comarca.

Doze anos depois, o mesmo Iterpa, considerando os “ajustes técnicos” feitos no perímetro da gleba, “a fim de eliminar a sobreposição” da gleba com a área federal, reduziu em nada menos do que 5,3 mil hectares a área original, que passou de 23.614 hectares para 18.332 hectares.

Não se trata de uma área qualquer. A gleba ganhou esse nome, de ampulheta, pelo formato do restinho de terra que sobrou ao Estado em 1976. Foi quando, num ato de império, o general Ernesto Geisel, que era o presidente da república, determinou a federalização da área onde está localizada a mais rica reserva de minério de ferro do planeta.

O ato imperioso se deveu a uma denúncia (que fiz na época, em O Estado de S. Paulo e O Liberal, quase provocando uma CPI na Câmara Federal) de que havia tentativa de corrupção à margem da venda à Vale (ainda estatal) de uma área de 412 mil hectares de terras estaduais pelo governo do Estado. Houve o prolongamento da BR-158, de São Félix do Araguaia a Altamira, passando exatamente sobre a área da província mineral de Carajás.

Mesmo o ato se baseando apenas no traçado cartográfico da estrada (que nem constava do plano rodoviário nacional), 100 quilômetros de cada lado da estrada abstrata passaram para a jurisdição da União. Restou ao Estado a gleba ampulheta.

A importância dessa área é mais do que evidente. Ela se limita com a Floresta Nacional de Carajás, uma das barreiras ainda existentes ao avanço da feroz frente de desmatamento que destrói as florestas da região. Com assentamentos, como o Valentim Serra e o Rio Branco. Com a gleba estadual Rio Azul. Está no limite dos municípios de Parauapebas e Marabá.

É estranho que o Iterpa tenha feito a redução da área baseado num processo instaurado em 2008, dois anos antes de arrecadar a área com seu tamanho original, de mais de 32 mil hectares, e a matriculado no registro de imóveis de Parauapebas, em 2010. E só concluído o processo 12 anos depois dessa primeira medição e demarcação, a diminuindo em mais de 5 mil hectares.

O memorial descritivo é minucioso e feito com a melhor tecnologia. Mas não há um croqui da área para a sua visualização. E o mais grave: o Iterpa não informa quais as áreas incidentes anteriormente matriculadas no cartório de registro de imóveis foram excluídas da poligonal descrita.

Ou seja: inexiste qualquer controle institucional sobre o Iterpa, que arrecada, permuta, doa, vende, inclui e exclui ao seu arbítrio, dispondo do que resta de patrimônio fundiário próprio do segundo maior Estado do país. E assim vai privatizando as terras consideradas devolutas ou públicas do Pará.

A imagem acima mostra as glebas no entorno da Floresta Nacional de Carajás no limite entre os municípios de Paraupebas e Marabá (print do Google Earth).

Além de colaborar com a agência Amazônia Real, Lúcio Flávio Pinto mantém quatro blogs, que podem ser consultados gratuitamente nos seguintes endereços:

* lucioflaviopinto.wordpress.com – acompanhamento sintonizado no dia a dia.

* valeqvale.wordpress.com – inteiramente dedicado à maior mineradora do país, dona de Carajás, a maior província mineral do mundo.

* amazoniahj.wordpress.com – uma enciclopédia da Amazônia contemporânea, já com centenas de verbetes, num banco de dados único, sem igual.

* cabanagem180.wordpress.com – documentos e análises sobre a maior rebelião popular da história do Brasil.

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Sobre a matéria

Citações

Este texto foi corrigido: o tamanho da área em questão é de 23.614 hectares e não 32.614 hectares, como publicado erroneamente.

Local de Cobertura

Belém (PA)

Lúcio Flávio Pinto

Lúcio Flávio Pinto é jornalista desde 1966. Sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973. Editor do Jornal Pessoal, publicação alternativa que circula em Belém (PA) desde 1987. Autor de mais de 20 livros sobre a Amazônia, entre eles, Guerra Amazônica, Jornalismo na linha de tiro e Contra o Poder. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace. Em 2005 recebeu o prêmio anual do Comittee for Jornalists Protection (CPJ), em Nova York, pela defesa da Amazônia e dos direitos humanos. Lúcio Flávio é o único jornalista brasileiro eleito entre os 100 heróis da liberdade de imprensa, pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras em 2014. Acesse o novo site do jornalista aqui www.lucioflaviopinto.com.

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2 Comentários

Jarvis disse:

05/07/2022 às 10:44

A matéria é interessante para reflexão, só sugiro que seja corrigida a informação sobre o tamanho real da área antes da redução. Inicialmente falou de 23.614 hectares… que com a redução de 5.300 hectares ficaria com 18.314 hectares aproximadamente. Mas em dois momentos cita que a área original eram 32 mil hectares. Na primeira está como 32.614 que percebesse uma inversão do 23 para 32.
De qualquer maneira parabéns pela matéria.

Abraço
Jarvis!

Responder
- Kátia Brasil disse:
  
  10/07/2022 às 20:27
  
  Obrigada pela atenção.
  
  Responder