Meio Ambiente

Promotoria de Justiça determina análise da água de Parintins

O Ministério da Saúde (MS) concluiu, em 20 de maio deste ano, que “mais de 90% da população consome água sem tratamento” (Foto: Keith Rock) Manaus (AM) – A 1ª Promotoria de Justiça de Parintins determinou que a empresa pública […]

Reprodução Facebook Keith Rock

Por Izabel Santos Publicado em: 10/07/2019 às 02:43

O Ministério da Saúde (MS) concluiu, em 20 de maio deste ano, que “mais de 90% da população consome água sem tratamento” (Foto: Keith Rock)

Manaus (AM) – A 1ª Promotoria de Justiça de Parintins determinou que a empresa pública Serviço Geológico do Brasil (sigla para CPRM), subordinada ao Ministério de Minas Energia, analise os 29 poços tubulares da rede de abastecimento da cidade para investigar o que classificou de “denúncia de suposta poluição por metais nas águas de abastecimento do município”.

Conforme reportagem publicada pela agência Amazônia Real, laudos da Companhia de Saneamento do Amazonas (Cosama) e da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) constataram a presença de coliformes fecais, alumínio e chumbo, com valores acima do permitido ao consumo humano, em 15 dos 29 poços tubulares de Parintins.

Com bases nesses laudos, o Ministério da Saúde (MS) concluiu, em 20 de maio deste ano, que “mais de 90% da população consome água sem tratamento”. Portanto, ficou constatado que a água do município é “imprópria para consumo humano”, diz o MS.

Em entrevista à agência Amazônia Real, na sexta-feira (5), a promotora Marina Campos Maciel disse que deu prazo de 60 dias, a contar do dia 3 de junho, para que a Prefeitura de Parintins apresentasse os novos laudos, que serão realizados pela CPRM.

A promotora havia instaurado um inquérito civil, no dia 27 de abril, com o objetivo de investigar a Prefeitura de Parintins e o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae), responsável pelo abastecimento e saneamento do município, que tem mais de 113 mil habitantes. A cidade está localizada na região do Baixo Rio Amazonas, a 369 quilômetros de Manaus.

“Inicialmente, o Saae tem a responsabilidade de garantir água de qualidade para a população. Mas o saneamento básico não é uma responsabilidade apenas do município; é também do governo do Estado. Após a entrega do relatório da nova análise que será realizada pela CPRM, vamos chamar quem for necessário para que finalize essa adequação”, disse a promotora Marina Campos Maciel.

O prefeito Bi Garcia (de blusa amarela) com populares ( Foto: Daniel Sicsú )

Como publicou a Amazônia Real, a Cosama realizou testes em sete poços tubulares do Saae, no dia 26 de março de 2019. O Laudo de Medição Para Potabilidade apontou “a presença de coliformes fecais, bem como o parâmetro de alumínio com valores acima do máximo permitido”, além de “nitrato acima do valor máximo permitido”.

Já o curso de Mestrado Profissional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) analisou as amostras de água coletadas em oito poços, entre os dias 28 e 29 de abril de 2018. Na conclusão, foram identificados “valores de metais como alumínio, chumbo, amônia e nitrato acima dos parâmetros permitidos pela legislação vigente, estando inaptos [à potabilidade]” e “não foi encontrado cloro livre em todas as amostras, o que está em desacordo com a legislação vigente. Estando o sistema suscetível à presença de coliformes fecais (presente em fezes) e a proliferação de microrganismos na rede de abastecimento de Parintins”.

A promotora Marina Maciel disse que antes da reportagem ser publicada, já havia determinado a abertura da investigação contra a prefeitura e o Saae. Mas, segundo ela, “a matéria da Amazônia Real pesou bastante, pois nos trouxe novas informações”, acrescentou ela.

Perguntada por que a investigação não foi aberta em 2018, já que a UEA apontou que a água da cidade era imprópria para o consumo, Marina explicou que a 1ª Promotoria acompanha a questão desde setembro do ano passado.

“Tinha um procedimento extrajudicial na promotoria para apurar essa questão da água, mas já havia sido encerrado. Como não conseguimos chegar ao fim das investigações para tomarmos as medidas necessárias para resolver o problema, ele foi convertido em inquérito civil”, disse a promotora Marina Maciel.

O problema da contaminação da água potável em Parintins ganhou repercussão em junho, quando a promotora de Justiça Lilian Nara Pinheiro de Almeida questionou o valor do cachê de R$ 500 mil, pago pela prefeitura, com recursos do governo do Amazonas e parcerias, à cantora carioca Anitta. “Em média, a cantora Anitta cobra cachê de R$ 200 mil e o dinheiro poderia ter melhor uso,” como “ser utilizado, por exemplo, para resolver o problema de contaminação da água em Parintins”.

A cantora carioca Anitta realizou um show no dia 27 de junho, na abertura do festival dos bois bumbá Caprichoso e Garantido da cidade. Segundo o governo do Amazonas, a parceria é com a empresa Coca-Cola Brasil, que investiu R$ 2,5 milhões no Festival Folclórico de Parintins de 2019. Coube ao governo arcar com recursos na ordem de R$ 5,1 milhões. O dinheiro é repassado à Prefeitura de Parintins, que é administrada pelo prefeito Bi Garcia (PSDB).

Com relação as verbas destinadas ao Festival Folclórico de Parintins 2019, a promotora Lilian Nara Pinheiro de Almeida, da 2ª Promotoria de Justiça, abriu dois inquéritos civis, no dia 2 de julho, para investigar a Prefeitura de Parintins. O primeiro visa apurar os procedimentos de contratações musicais para a Festa dos Visitantes, no caso o show de Anitta, assim como a cobrança de ingressos à referida festa – que era pública. O segundo inquérito é para apurar a contratação das obras de engenharia e infraestrutura para a realização da Festa dos Visitantes.

Por causa da contaminação da água, ao menos dez estudantes universitários de faculdades públicas e particulares de Manaus, que participavam do Congresso de Comunicação Intercom Norte, organizado pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), foram subitamente acometidos pela infecção intestinal, em Parintins.

O silêncio de Bi Garcia

O prefeito Bi Garcia (PSDB) administrou a Prefeitura de Parintins de 2004 a 2008, e de 2008 a 2012. Em 2016, ele foi eleito novamente. Desde o dia 27 de junho, a reportagem da Amazônia Real solicita uma entrevista para ele explicar a questão da contaminação da água potável distribuída à população. Até o presente momento, a assessoria de imprensa da prefeitura não respondeu às perguntas enviadas.

Em 2005, CPRM encontrou metais

Lixo em Parintins (Foto: Igor Souza/Nepaa-Ufam)

A CPRM, que agora fará as análises nos 29 poços tubulares de Parintins, a pedido da Justiça, já havia emitido um laudo anterior, apontando a presença de metais na água, como ferro, chumbo e outros contaminantes, presentes em poços analisados na cidade, em 2005. A partir daí, nem a Prefeitura de Parintins nem o governo do Amazonas solicitaram novas análises dos poços à empresa pública, conforme disse o geólogo José Marmos, supervisor de gestão territorial.

Ele participou dos trabalhos há 14 anos e agora será coordenador das novas análises. Segundo Marmos, elas serão realizadas pelo Laboratório de Análises Minerais (Lamin), que pertence ao órgão federal. O pagamento das análises da água de Parintins será oriundo da receita de multas ambientais recolhidas pelo governo do Amazonas.

Sobre as causas da contaminação da água de Parintins, o geólogo José Marmos disse que as análises realizadas em 2005 apontaram que alguns poços eram rasos de profundidade e situados muito próximos à lixeira pública da cidade. “Hoje, não sei se os lixões permanecem onde estavam na época da primeira análise em 2005, mas pela localização da lixeira municipal, creio que a situação é a mesma”, disse, o geólogo, ressaltando, ainda:

“A água em Parintins é contaminada pela carência do sistema de esgotamento sanitário. Os dejetos orgânicos, como o esgoto doméstico, se infiltram no aquífero, que são as águas subterrâneas, e provocam sua contaminação, principalmente por compostos nitrogenados, como amônia e nitrato”, explicou Marmos à Amazônia Real.

Sobre as recomendações que podem ser realizadas pela CPRM, a promotora Marina Maciel é cautelosa, mas aponta um direcionamento que pode ser tomado. “Nossa intenção é seguir as orientações do relatório da nova análise que será realizada pela CPRM, por exemplo, quanto à profundidade dos poços. Mas, futuramente, a nossa intenção é que seja instalada uma estação de tratamento de água na cidade”, disse ela.

O que diz a Secretaria Municipal de Saúde?

Em entrevista por telefone, a coordenadora da Vigilância em Saúde de Parintins, a bióloga Elaine Pires Soares, contestou os laudos do Cosama, da UEA e a conclusão do Ministério da Saúde, que concluiu que a água fornecida pelo Saae é imprópria para o consumo da população.

A bióloga é subordinada ao secretário municipal de Saúde, Clerton Rodrigues Florêncio. Elaine Soares explicou que o “Vigiagua faz a coleta, a análise e a produção de um relatório com os resultados de todos os poços de bombeamento de água da cidade e encaminha ao Saae, que é responsável pela distribuição da água”, disse.

Segundo a bióloga, “eles (o Saae) que tomam as medidas necessárias, com base nas informações que geramos. Ao todo, realizamos anualmente 498 análises nos 23 poços da zona urbana e nos 6 da zona rural”, diz a coordenadora Elaine Pires Soares.

O Vigiagua é o Programa Nacional de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano, do Ministério da Saúde, que é estruturado a partir dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), e desempenha um papel importante para garantir a qualidade e segurança da água para consumo humano no Brasil.

“Quando recebemos a denúncia sobre contaminação da água pelo MP-AM, com base no relatório da UEA, entramos em parceria com a Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas para acompanhamento da situação. Foi então que começaram as divergências, pois as análises do Lacen e da Cosama apresentaram um resultado diferente dos nossos. Por isso, durante a Audiência Pública, realizada em 03 de junho, acordamos que a CPRM faria uma nova análise para determinar as inconformidades no que diz respeito à presença de metais”, explicou a bióloga da Secretaria Municipal de Saúde de Parintins.

Laboratório da Saae (Foto: PMP)

Elaine Pires Soares disse à Amazônia Real que a Secretaria Municipal de Saúde contestou as presenças de coliformes fecais na água de Parintins, como apontou as análises da Cosama e da UEA. No entanto, ela admitiu que há a presença de alumínio, ferro e chumbo na água consumida pela população, mas em apenas um poço. “Nas nossas análises, apenas um poço apresentou presença de metais, mas acredito que precisamos de um estudo mais aprofundado sobre a origem desses metais para avaliar todas as possibilidades de contaminação”. A bióloga também negou que a origem da contaminação sejam os lixões de Parintins.

Em janeiro de 2018, a Secretaria Municipal de Saúde apresentou um parecer técnico do Lacen ao Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) dando ciência de que a água potável de Parintins apresentava contaminação por coliformes total e pediu providências. O documento consta nos relatórios da própria Saae.

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Reportagem Noticiosa

Sobre a matéria

Izabel Santos

É graduada em Jornalismo pela Faculdade Martha Falcão, de Manaus (AM). Tem mais de dez anos de atuação na cobertura de política e meio ambiente. Trabalhou no Jornal Amazonas Em Tempo; no Portal Amazônia, foi coordenadora de jornalismo na rádio CBN Amazônia e coordenadora de jornalismo no canal televisivo Amazon Sat. Foi indicada ao Prêmio Milton Cordeiro de Jornalismo em 2014, na categoria Internet, pela série de reportagens "Balbina, hidrelétrica da contradição". Foi a jornalista responsável pelas ações de divulgação científica da segunda fase do INCT Adapta, projeto científico sediado no Inpa que investiga o impacto das mudanças climáticas nos organismos aquáticos da Amazônia. ([email protected])