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CNJ determina rigor em processos de pedofilia no Amazonas

Por Kátia Brasil Publicado em: 20/01/2014 às 20:11

O Conselho Nacional de Justiça determinou nesta segunda-feira (20) rigor na apuração de indícios de irregularidades na tramitação de processos em curso no Tribunal de Justiça do Amazonas que têm como alvo o prefeito de Coari, Manoel Adail Amaral Pinheiro (PRP). Desde o ano de 2008, ele é réu numa ação penal que investiga crimes de favorecimento à prostituição infantil, mas teria sido beneficiado por decisões de juízes estaduais em troca de privilégios.

Não é a primeira vez que o CNJ envie membros da Corregedoria Nacional de Justiça para fiscalizar as ações de juízes em processos do município de Coari. Entre 2010 e 2012, três magistrados foram aposentados compulsoriamente por favorecimento de decisões em processos da administração do prefeito Adail Pinheiro. Outros dois juízes foram censurados no mesmo caso.

A correição (apuração) determinada pelo Conselho Nacional de Justiça nos processos do TJ do Amazonas é uma retomada das investigações abertas em abril de 2013, mas acontece um dia após o programa Fantástico (Globo) divulgar novas denúncias de abusos de crianças e adolescentes contra Adail Pinheiro.

Segundo a reportagem veiculada no domingo (19), uma menina de 13 anos foi prometida ao prefeito pela mãe dela em troca de R$ 2.000. Com medo das ameaças da mãe, a garota foi retirada da cidade de Coari (a 362 quilômetros de Manaus) por parentes, segundo o Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente.

A apuração de suposto favorecimento de juízes nos processos que envolve o prefeito Adail Pinheiro é coordenada pelo conselheiro Gilberto Valente Martins, que está em Manaus, sem prazo para retorno. Na correição, ele é acompanhado por quatro juízes auxiliares e cinco servidores do Conselho Nacional de Justiça.

Em coletiva na sede do TJ Amazonas, o conselheiro Gilberto Valente Martins disse que a correição dará prioridade aos processos que ainda não foram julgados e que envolvem o prefeito Adail Pinheiro em abusos de crianças e adolescentes. “Pela gravidade e por possuir pessoas vulneráveis pela própria norma Constitucional e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, esses processos terão prioridade absoluta”, afirmou o conselheiro.

O presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas, desembargador Ari Mourinho não se pronunciou sobre a correição do CNJ.

Durante a correição, a comissão do Conselho Nacional de Justiça também investigará as questões que envolvem a ampliação do número de desembargadores do Tribunal de Justiça do Amazonas, de 19 para 26 magistrados, sob o argumento de necessidade de dinamizar as decisões nos processos do segundo grau, que é a última instância em termos de recursos no âmbito estadual, antes dos processos seguirem para as Cortes superiores.

Em nota, o CNJ diz que, em novembro do ano passado, impediu o TJ do Amazonas adotar qualquer providência para preenchimento dos novos cargos de desembargador, criados pela Lei Complementar nº 126 e sancionada pelo governo do Amazonas, que alterou a estrutura administrativa do órgão.

Prostituição

O suposto envolvimento do prefeito Adail Pinheiro numa rede de prostituição infantil foi descoberto pela Operação Vorax da Polícia Federal, em 2008. A operação investigou, durante dois anos, um esquema de sonegação fiscal e fraudes em licitações. O prefeito foi preso com outras 22 pessoas, entre secretários, servidores públicos e comerciantes.

O desvio de verbas públicas anunciado na época foi de R$ 30 milhões na administração pública do município de Coari (AM). A cidade tem como principal arrecadação o pagamento de royalties pela produção de gás natural da Petrobras.

Escutas telefônicas realizadas pela Polícia Federal revelaram que garotas eram aliciadas por cafetões e cafetinas em Manaus e Coari. Na capital amazonense, segundo as investigações, as meninas viajavam para participar das festas de Adail Pinheiro no município de Coari. Eram transportadas no avião da prefeitura, que deveria atender apenas os doentes da cidade. Para driblar escutas telefônicas, as meninas eram denominadas de “jornalistas” da “BBC de Londres” e da “CNN”.

Os casos de prostituição infantil envolvendo Adail Pinheiro na Operação Vorax foram deslocados da Justiça Federal para o Tribunal de Justiça do Amazonas devido a competência.

As denúncias contra o prefeito Adail Pinheiro foram denunciados à CPI da Câmara dos Deputados que investiga a exploração sexual infantil.

Punições aos magistrados

As escutas telefônicas da Operação Vorax da Polícia Federal também revelaram o suposto envolvimento de cinco juízes do Tribunal de Justiça do Amazonas em tráfico de influência e desvio de conduta nas decisões que favoreceram a Prefeitura de Coari, durante a gestão do prefeito Adail Coari.

Dos magistrados investigados pelo Conselho Nacional de Justiça entre os anos de 2010 e 2012, três foram aposentados compulsoriamente: o ex-vice-presidente do TJ (2008), desembargador Francisco Auzier, os juízes Rômulo José Fernandes da Silva e Hugo Fernandes Levy Filho.

Os juízes Elci Simões de Oliveira e Ana Paula de Medeiros Braga foram censurados devido a indícios de favorecimento ao prefeito.

A juíza Ana Paula de Medeiros Braga, que é filha do secretário estadual de Cultura do Amazonas, Robério Braga, foi julgada após recursos impetrados no Supremo Tribunal Federal.

As escutas da PF registraram a magistrada cobrando de servidores da prefeitura o pagamento de um aluguel do apartamento onde ela morava em Coari. As investigações configuraram troca de privilégios pessoais, mas o CNJ decidiu apenas censurá-la com a transfência para a Comarca de Presidente Figueiredo. No processo, a juíza Ana Paula Braga nega que recebeu favores em troca de decisões judiciais.

A reportagem procurou o advogado do prefeito Adail Pinheiro, Alberto Simonetti Neto. Ele disse que defende o prefeito em numa ação penal que tramita no TJ do Amazonas e, na qual Pinheiro consta como réu na acusação de favorecimento à prostituição.

Sobre a correição do CNJ, o advogado afirmou que o processo não teve privilégios. “O processo transcorre normalmente e nem a defesa e nem o acusado nunca praticaram atos procrastinatórios (deixar para depois) para o andamento do processo. Ele é acusado, mas como todo brasileiro pode se defender”, afirmou.

Com relação as acusações de prostituição infantil, Alberto Simonetti Neto afirmou que são inverdades. “O prefeito se mostra bastante revoltado. Segundo a versão dele, isso tudo é teatro. Tudo fomentado pelos opositores políticos dele”, disse o advogado.

Atualmente Adail Pinheiro cumpre o terceiro mandato de prefeito de Coari. Ele administrou o município de 2005 a 2008. Em 2009, teve a candidatura negada para deputado estadual pela Lei da Ficha Limpa por condenações de ações de abuso de poder econômico. Foi eleito pela primeira vez em 2001, permanecendo no cargo até 2004.

Atualizado às 23h.

Reportagem Noticiosa

Sobre a matéria

Kátia Brasil

Kátia Brasil é co-fundadora e editora executiva da agência de jornalismo independente e investigativo Amazônia Real, com sede em Manaus (AM). Recém formada pela Faculdade Hélio Alonso, no Rio de Janeiro, foi morar na Amazônia no início do ano de 1990. Trabalhou na TV Cultura e jornais O Globo, A Gazeta de Roraima, O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo. Entre os prêmios que ganhou estão o Esso Regional Norte 1991 e Women Journo Heroes (#JournoHeroes), da International Women’s Media Foundation (IWMF), em 2019, Prêmio Abraji, em 2020, Vladimir Herzog e Comunique-se, ambos em 2021. É conselheira da Énois Jornalismo, do Tornavoz e Projor. Integra o forbiddenstories.org, o Fórum Permanente das Mulheres de Manaus (FPMM) e do Coletivo Mães Pela Diversidade ([email protected])