A Amazônia segundo Lúcio Flávio Pinto

O paraíso virou pesadelo

Por Lúcio Flávio Pinto Publicado em: 06/05/2020 às 14:54

O rendimento médio mensal real domiciliar per capita (com o qual uma família inteira se mantém) na Amazônia, de 872 reais, foi o menor do Brasil no ano passado, segundo dados da PNAD contínua apresentados hoje pelo IBGE. Foi superado pelo mesmo tipo de rendimento no Nordeste (que era o último), de R$ 884. Ambos os valores ficaram abaixo da média nacional, de R$ 1.406.

O rendimento médio real obtido de todas as fontes por um habitante do país foi o maior no Sudeste (de R$ 2.645), seguido pelo Sul (R$ 2.499) e Centro-Oeste (R$ 2.498), enquanto os menores valores estavam no Nordeste (R$ 1.510) e no Norte (R$ 1.601). Nos dois casos, mil reais a menos. A média nacional foi de R$ 2.244

Os que possuíam algum tipo de rendimento eram 131,2 milhões (62,6% da população), tendo o Sul apresentado o maior percentual em todos os anos da série (68,1%), enquanto Norte (54,5%) e Nordeste (58,5%), os menores.

Já o rendimento médio mensal real proveniente de outras fontes de renda (como aposentadoria, pensão, aluguel) registrou valor médio de R$ 1.539 em 2019. O Norte ficou com a menor média (R$ 1.014) e o Sudeste (R$ 1.891), com a maior.

A massa de rendimento do Sudeste, de R$ 111,5 bilhões, foi três vezes maior que a de outras regiões. A menor massa foi registrada no Norte (33,1 bilhões). Já a massa mensal de rendimento domiciliar percapita alcançou R$ 294,4 bilhões no país.

O Sudeste também acumulou a maior massa de rendimento domiciliar per capita brasileiro (R$ 151,9 bilhões), o que correspondia a 51,6% da massa total e 10 vezes mais do que a massa do Norte (R$ 15,8 bi), a menor dentre as regiões.

A Amazônia, além disso, foi a única região brasileira a apresentar redução na massa de rendimento domiciliar per capita (-4 %), enquanto a região Nordeste foi a que apresentou maior crescimento (5,1%), seguida pelo Sul (3,2%).

Metade dos trabalhadores com menores rendimentos receberam, em média, R$ 850 no ano passado. A média no Sul, a maior, foi de R$ 1.102. No Norte foi de R$ 633 e no Nordeste, 659.

Para dar uma dose de relatividade humana a esses números, é preciso considerar que em 2019 havia 209,5 milhões de pessoas residentes no Brasil. O Sudeste concentrava a maior parte da população (42,2%) e o Centro-Oeste (7,7%), a menor parte. O Nordeste 27,2% e o Norte 8,6%, mais habitantes do que o Centro-Oeste, com 7,7% de moradores, mas distribuindo entre eles mais rendimentos.

A leitura desses números pode ser difícil, mas é preciso lê-los, principalmente por serem de fonte oficial, produzidos por uma instituição, como o IBGE, que mantém a sua excelência técnica, apesar de tantas pressões e interferências ao longo do tempo.

Quando os militares, em plena ditadura, comandaram e induziram a marcha para a Amazônia, nos anos de 1970, garantiam que transformariam aquela região, a que mais tardiamente se tornou brasileira, a última a se integrar por terra ao restante do Brasil, abrigando a maior floresta tropical e a maior bacia hidrográfica do planeta, na nova e rica fronteira do país. De cuja exploração a nação extrairia as fontes de acesso ao topo das economias do mundo.

Nela, os sem-terra finalmente teriam acesso à propriedade de um lote, dando origem a uma nova classe média rural, liberta de séculos de dependência aos donos das propriedades no restante do país. O desenvolvimento acelerado seria conciliado com o respeito aos habitantes nativos e ao meio ambiente. A última página do Gênesis, que o criador divino delegou aos homens nessa imensa região, com a maior biodiversidade da Terra, seria finalmente escrita.

Os números do IBGE demonstram, mais uma vez, que essa utopia está distante, cada vez mais distante. E que a realidade oposta, cada vez mais cruel.

A fotografia que abre este artigo é de autoria de Alberto César Araújo/Amazônia Real

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* valeqvale.wordpress.com – inteiramente dedicado à maior mineradora do país, dona de Carajás, a maior província mineral do mundo.

* amazoniahj.wordpress.com – uma enciclopédia da Amazônia contemporânea, já com centenas de verbetes, num banco de dados único, sem igual.

* cabanagem180.wordpress.com – documentos e análises sobre a maior rebelião popular da história do Brasil.

Lúcio Flávio Pinto é jornalista desde 1966. Sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973. Editor do Jornal Pessoal, publicação alternativa que circula em Belém (PA) desde 1987. Autor de mais de 20 livros sobre a Amazônia, entre eles, Guerra Amazônica, Jornalismo na linha de tiro e Contra o Poder. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace. Em 2005 recebeu o prêmio anual do Comittee for Jornalists Protection (CPJ), em Nova York, pela defesa da Amazônia e dos direitos humanos. Lúcio Flávio é o único jornalista brasileiro eleito entre os 100 heróis da liberdade de imprensa, pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras em 2014. Acesse o novo site do jornalista aqui www.lucioflaviopinto.com.

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Sobre a matéria

Lúcio Flávio Pinto

Lúcio Flávio Pinto é jornalista desde 1966. Sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973. Editor do Jornal Pessoal, publicação alternativa que circula em Belém (PA) desde 1987. Autor de mais de 20 livros sobre a Amazônia, entre eles, Guerra Amazônica, Jornalismo na linha de tiro e Contra o Poder. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace. Em 2005 recebeu o prêmio anual do Comittee for Jornalists Protection (CPJ), em Nova York, pela defesa da Amazônia e dos direitos humanos. Lúcio Flávio é o único jornalista brasileiro eleito entre os 100 heróis da liberdade de imprensa, pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras em 2014. Acesse o novo site do jornalista aqui www.lucioflaviopinto.com.

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1 Comentário

Alessandro de sousa almeida disse:

09/05/2020 às 15:01

Enquanto isso, na Seduc-Pa, servidores ganhando menos que o salário mínimo, 998, o que é inconstitucional. É o aumento da alíquota da previdência para 14% para os servidores.

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