Philip M. Fearnside

Amazônia e o Aquecimento Global: 2 – Negadores do clima

A realidade do aquecimento global não impediu que a negação da mudança climática se tornasse uma força significativa no Brasil. A ilustração mais dramática disso foi o controle essencialmente completo que os negacionistas tinham sobre a mídia brasileira na […]

O fogo na Amazônia oferece risco às pessoas e aos animais e contribui com as emissões de gases do efeito estufa (Foto: Daniel Beltrá/Greepeace)

Por Philip Martin Fearnside Publicado em: 27/11/2018 às 16:30

A realidade do aquecimento global não impediu que a negação da mudança climática se tornasse uma força significativa no Brasil. A ilustração mais dramática disso foi o controle essencialmente completo que os negacionistas tinham sobre a mídia brasileira na época do evento Rio + 20 em 2012 (ver: [1]). Os “ruralistas” do Brasil, que refletem os interesses do agronegócio, estão particularmente enamorados com o negacionismo [2]. Representantes ruralistas atualmente controlam 40% da Câmara dos Deputados no Congresso Nacional, fato que resultou em uma longa série de reveses recentes para as políticas ambientais brasileiras [3].

O aquecimento global é causado pelo acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera em níveis acima daqueles que prevaleceram antes das emissões humanas aumentarem acentuadamente na época da revolução industrial. As emissões acima dos níveis “naturais” vêm da combustão de combustíveis fósseis, desmatamento e outras fontes antropogênicas. Esses gases bloqueiam parte da energia que a Terra recebe do Sol de ser devolvida ao espaço exterior na forma de radiação infravermelha, aumentando assim a temperatura do ar na superfície da Terra (Figura 1).

A energia do Sol entra na atmosfera como radiação ultravioleta de ondas curtas. Cerca de metade desta atinge o solo, onde quase toda a energia é absorvida e, em seguida, re-irradiada sob a forma de radiação infravermelha de ondas longas. Gases de efeito estufa que estão naturalmente presentes na atmosfera, além daqueles que foram adicionados por humanos, inibem a passagem da radiação infravermelha, retornando este calor para a superfície.

A alegação de negacionistas do clima que aumentos observados de temperatura são frutos da variação natural das manchas solares e outros eventos que alteram a quantidade de energia que entra na atmosfera implicariam um aumento de temperatura igualmente distribuído ao longo de todo o perfil vertical na atmosfera.

No entanto, o aquecimento é maior na parte do perfil onde os gases de efeito estufa se concentram – um fato para o qual os negacionistas não têm explicação.

Figura 1 – Balanço de energia da Terra a partir do relatório mais recente do IPCC (o Quinto Relatório de Avaliação, ou AR5). Os valores estão em Watts por metro quadrado ([4], p. 181).

As temperaturas globais aumentaram significativamente (Figura 2). O aumento já é suficiente para ter efeitos prontamente observáveis, e as projeções são para aumentos substancialmente maiores nas próximas décadas. O cenário “negócios como sempre” (“business as usual”) aproximado (RCP8.5) do relatório mais recente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) projeta que a temperatura global média de 2100 deve aumentar em 4,8°C sobre a média de 1996-2005 ([5], p. 6).[6]

Figura 2 – Temperatura global média desde 1850 [5].

Notas

[1] Fearnside, P.M. 2015. Os céticos de clima no Brasil. Amazônia Real 16 & 23 de março de 2015.

[2] Mello, P.C. & A. Prado, 2018. Chuva escasseia no Matopiba, onde ruralistas duvidam dos efeitos do aquecimento global. Folha de São Paulo, 22 de maio de 2018. P. B-6.

[3] Fearnside, P.M. 2018. Challenges for sustainable development in Brazilian Amazonia. Sustainable Development 26(2): 141-149

[4] Cubasch, U., D. Wuebbles, D. Chen, M.C. Facchini, D. Frame, N. Mahowald & J.-G. Winther. 2013. Introduction. In: Climate Change 2013: The Physical Science Basis. Contribution of Working Group I to the Fifth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. Stocker, T.F., D. Qin, G.-K. Plattner, M. Tignor, S.K. Allen, J. Boschung, A. Nauels, Y. Xia, V. Bex & P.

A fotografia que abre este artigo é da Floresta Amazônica em chamas, um risco às pessoas, a fauna e flora, além de contribuir com o aumento das emissões de gases do efeito estufa (Foto: Daniel Beltrá/Greenpeace)

Leia o artigo que abre a série: Amazônia e o Aquecimento Global: 1 – Resumo da Série

Leia a última série do autor: Hidrelétricas e Aquecimento Global

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências e também coordena o INCT (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia) dos Serviços Ambientais da Amazônia. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 500 publicações científicas e mais de 200 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.

Reportagem Noticiosa

Sobre a matéria

Philip Martin Fearnside

É doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 600 publicações científicas e mais de 500 textos de divulgação de sua autoria que podem ser acessados aqui. https://philip.inpa.gov.br