Emprego informal é a maior alternativa aos haitianos

Por: Liège Albuquerque | 20/10/2013 às 20:07

Imigrante haitiana trabalhando em empresa da Zona Franca. (Foto: Alberto César Araújo/AR)

Embora não exista levantamento oficial do Ministério do Trabalho, ainda é a construção civil que mais emprega os haitianos, que imigraram para o Brasil após o terremoto em 2010.
Mais de 16 mil entraram no país pelos Estados do Acre e do Amazonas em viagens que iniciaram na capital Porto Príncipe, passando pela República Dominicana, Equador, Peru e Bolívia.
De pele negra, altos, sérios ou muito sorridentes, seus passos firmes pelas calçadas rumo aos pontos de ônibus, sempre com as indefectíveis pastas com currículo e documentos, mudaram a paisagem cotidiana de cidades como Manaus, Tabatinga, no Amazonas, Brasiléia ou Rio Branco, no Acre. Também seguiram para Porto Velho, São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) apontam o crescimento do número de carteiras de trabalho aos haitianos. Entre 2008 e 2010, apenas 20 vistos de trabalho a pessoas daquele país foram emitidos no Brasil.
Em Manaus, segundo o MTE no Amazonas, só no ano de 2011 foram emitidas 1.391 Carteiras de Trabalho e Previdência Social (CTPS) para estrangeiros vindos do Haiti. A regional do MTE expediu no ano seguinte 1.878 CTPS para haitianos. Este ano o número de carteiras emitidas ainda está sendo consolidado, mas segundo a assessoria de imprensa da regional, o número pode ter crescido ao menos 30% em relação ano passado.
Segundo o padre Valdecir Molinari, da Igreja de São Geraldo, em Manaus, além da construção civil e seus empregos esporádicos, hoje há muitos restaurantes que empregam haitianos e, para as mulheres, as casas de família ainda são a alternativa em maior número de vagas. “Acho que os governantes podiam focar nos haitianos como boa mão de obra para a Copa, por serem bilíngues”, sugere.
Na estimativa do padre, cuja paróquia costuma ser o porto seguro dos haitianos que chegam no Amazonas, hoje há cerca de 1,2 mil trabalhando de carteira assinada. Ou seja, a maioria ainda trabalharia no setor informal, já que Molinari estima que ainda permanecem em Manaus cerca de 2,5 mil, dos aproximadamente 6 mil que chegaram na capital desde o terremoto. Esses cerca de 2,5 mil preferiram ficar na capital amazonenses em vez de buscar mais oportunidades em estados como São Paulo e Rio Grande do Sul.
Loulou Pierre, de 29 anos, é garçon de uma churrascaria em Manaus, cujo dono emprega um haitiano em cada um de seus três restaurantes. “São muito disciplinados”, diz um dos maitres, David Souza. Loulou, sorriso fácil, serve aos clientes com bom humor. “Fico muito feliz de estar trabalhando, podendo ajudar minha família no Haiti”. Como boa parte dos entrevistados, Loulou envia em média R$ 500 por mês aos familiares

Sem carteira assinada há quase um ano, Mario Joly, de 30 anos, está praticamente todos os dias em frente à igreja de São Geraldo buscando serviço. “Faço qualquer negócio, mas sei o que posso cobrar porque serviço braçal também precisa ser valorizado”, diz. Mario conta ter trabalhado bastante no setor de construção civil, mas destaca que o serviço tem diminuído. “Será que é porque a gente é taxado de exigente demais com pagamento certinho e regras de segurança? Não sei. Mas não dá para arriscar nisso precisando ajudar a família e tendo sobrevivido a um terremoto”.
O padre diz observar uma característica “que podia servir de exemplo aos brasileiros”, bem comum nos haitianos: sabem valorizar o preço de seu trabalho. “Você pode chegar aqui em frente à igreja, onde há sempre haitianos esperando que alguém lhes ofereça algum trabalho esporádico por não estarem de carteira assinada, e oferecer para fazer um serviço com preço bem abaixo do mercado. Eles não aceitam. Não se deixam explorar, isso é muito bom”.

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