Philip M. Fearnside

O derramamento de petróleo no Nordeste: um alerta para o Pré-Sal e para a Amazônia

Por Philip Martin Fearnside Publicado em: 28/10/2019 às 18:35

O impacto do atual desastre de petróleo nas praias do Nordeste do Brasil é limitado pela capacidade de um único navio petroleiro. A magnitude de um derramamento dos poços de petróleo subaquáticos no Pré-Sal seria incomparavelmente maior. Os acontecimentos recentes no Nordeste servem como alerta para o perigo apresentado pelo Pré-Sal, explicado no texto abaixo, que é uma tradução de uma carta do autor publicada em 2018 na seção de comentários online da revista Science [1].

Cabe lembrar que os riscos de derramamentos de petróleo também são muito presentes na Amazônia [2].

Bernadino e Sumida [3] recomendam a conservação de ecossistemas marinhos vulneráveis ameaçados pelo desenvolvimento da exploração de petróleo no Pré-Sal. A essa recomendação, gostaria de acrescentar a necessidade de repensar o próprio projeto de desenvolvimento petrolífero nessa área. Os impactos potenciais do vazamento de petróleo incluem ameaças para boa parte da costa brasileira e as suas famosas praias.

No desastre do Deepwater Horizon, em águas dos Estados Unidos em 2010, foram necessários cinco meses para controlar um vazamento a uma profundidade de água de 1.500 m. Os campos petrolíferos Pré-Sal do Brasil estão, na maior parte, em profundidades em torno de 2.200 m [4] e variam até 3.000 m [5].

Em 2011, o Ministro da Ciência e Tecnologia declarou publicamente que o País possui uma excelente capacidade de controle de vazamentos, tornando o risco inexistente. No entanto, se o Brasil realmente tivesse a capacidade de controlar vazamentos a essa profundidade, teria oferecido logo ajuda no Golfo do México.

A história indica que nenhum país do mundo tinha essa capacidade. É previsto que os planos Pré-Sal exacerbarão a ‘maldição dos recursos’ na economia brasileira [6]. O Pré-Sal também desafia a mitigação do efeito estufa, e, em novembro de 2017, os novos subsídios oferecidos pelo governo levaram o Brasil a ganhar um prêmio “Fóssil do Dia” na COP-23 [7]. [8]

Cabo de São Agostinho, Pernambuco (Foto: Gilberto Crispim/Fotos Públicas)

Notas

[1] Fearnside, P.M. 2018. Brazil’s offshore oil risks. [Science Online comment]

[2] Azevedo-Santos, V.M., J.R. Garcia-Ayala, P.M. Fearnside, F.A. Esteves, F.M. Pelicice, W.F. Laurance, R.C. Benine. 2016. Amazon aquatic biodiversity imperiled by oil spills. Biodiversity and Conservation 25(13): 2831–2834.

[3] Bernadino, A.F. & P.Y.G. Sumida. 2017. Deep risks from offshore development. Science 358: 312.

[4] Formigli, J. 2007. Pre-Salt Reservoirs Offshore Brazil: Perspectives and Challenges. Petrobrás, Rio de Janeiro.

[5] Martins, A.L., Á.F.L. Aragão, P.E. Aranha, M.G. Folsta, A.T. A. Waldmann, R.A. Gandelman & J.V.M. de Magalhães. 2009. Hidráulica de construção de poços em cenários críticos. Boletim Técnico da Produção de Petróleo 4(2): 183-200.

[6] Magalhães, A.S. & E.P. Domingues. 2014. Blessing or curse: Impacts of the Brazilian Pre-Salt oil exploration. Economia 15: 343–362.

[7] 350.org. 2017. Brazil wins ‘Fossil of the Day’ at COP 23.

[8] As pesquisas do autor são financiadas pelo Conselho Nacional do Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq: proc. 304020/2010-9; 573810 / 2008-7), Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM: proc. 708565) e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA: PRJ15.125). Esta é uma tradução de uma carta do autor publicada na seção de comentários online da revista Science [1].

A foto que abre este artigo mostra uma das praias Cabo de São Agostinho, em Pernambuco, onde o óleo poluiu o mar e a fauna aquática (Fotos: Gilberto Crispim/Fotos Públicas)

Leia os artigos da série do autor:

Valoração de Serviços Ambientais – 1: Resumo da Série

Valoração de Serviços Ambientais – 2: o que são os Serviços Ambientais?

Valoração de Serviços Ambientais – 3: Biodiversidade &Sociodiversidade

Valoração de Serviços Ambientais – 4: Ciclagem de Água

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências e também coordena o INCT (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia) dos Serviços Ambientais da Amazônia. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 500 publicações científicas e mais de 200 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.

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Sobre a matéria

Philip Martin Fearnside

É doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 600 publicações científicas e mais de 500 textos de divulgação de sua autoria que podem ser acessados aqui. https://philip.inpa.gov.br