O preço que se paga pela energia

RENAN ALBUQUERQUE Em setembro de 2011, quando o governo federal anunciou a queda no preço da energia elétrica, e em 2013 quando o anúncio foi ratificado, concretizou-se em parte o reconhecimento governamental acerca do que o Movimento dos Atingidos por […]

Por Amazônia Real Publicado em: 27/04/2014 às 21:49

RENAN ALBUQUERQUE

Em setembro de 2011, quando o governo federal anunciou a queda no preço da energia elétrica, e em 2013 quando o anúncio foi ratificado, concretizou-se em parte o reconhecimento governamental acerca do que o Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) denunciava há tempos: o Brasil possui, através da energia hidrelétrica nas atuais condições, uma das fontes mais baratas e o povo brasileiro paga uma das tarifas mais caras do mundo.

A setorial do MAB da Hidrelétrica de Balbina, no município de Presidente Figueiredo (a 112 km de Manaus), que possui vínculo com a direção nacional do movimento, destacou que a diminuição do preço para famílias do entorno daquela UHE deveria e poderia ser maior ainda se fossem, de fato, enfrentados os setores que estão ganhando dinheiro usando a água, os rios e explorando a situação.

A questão vai ao encontro de afirmativas de Lefebvre⁽¹⁾, quando ele entende manifestações sociopolíticas como modalidade de apropriação de territórios dominados: não sendo apenas uma possibilidade às pessoas que desenvolvem pertencimento afetivo e simbólico em relação ao ambiente, mas sim direito imanente a elas e que deve ser respeitado.

O autor afirma que a apropriação do território para o uso da energia disponível em forma de recurso reforça práticas sociais e políticas junto aos habitantes; internaliza o relacionamento intergrupal e a convivência social para os moradores; fomenta alegrias e tristezas, ações e contrações, sonhos e desejos de indivíduos.

O problema pode ser exemplificado por meio de uma entrevista que fiz anos atrás, ainda no doutorado, com uma liderança dos atingidos pela barragem de Balbina. Escutei da pessoa a seguinte afirmativa: “[…] devido a esses anos de experiência que eu tenho, que vou adquirindo aqui na área rural nessa comunidade, eu vou observando que a política tem muita influência aqui dentro do município. Dependendo de que lado tu tá ou como tu mexe tuas coisas, tu pode ser perseguido por isso ou então tu pode ser descartado também […] a política é um dos assuntos muito polêmicos que tem dentro do município de Presidente Figueiredo”⁽²⁾.

O entrevistado, afetado pelo processo de desterritorialização com a construção da usina de Balbina quando ainda era criança, observa a inserção da política nas atividades do cotidiano dos atingidos pela barragem, e crê que a energia gerada pela usina tendia menos a ser oriunda de projetos de bem-estar social do que de planos político-partidários estaduais e federais. E isso é uma verdade na Amazônia desde os anos da Ditadura, mostrando que cada pessoa vale pelo lugar onde está.

O seu valor como produtor, consumidor, cidadão, depende de sua localização no território, o qual regula convivências. E se o preço que se paga pela energia oriunda de usinas hidrelétricas na Amazônia fosse conivente com a tragédia socioambiental gerada pelas construções de UHEs, tende a supor-se que o custo deveria ser muito menor do que é atualmente.

O cenário vai mudar? Segundo os dados apontam, a médio prazo não. Com a Copa do Mundo e as Olimpíadas, a tendência é que o preço da energia elétrica aumente para atender aos negócios da urbe. E a Amazônia que continue a servir de laboratório de exploração, enquanto seus recursos não forem aniquilados.

(1) LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991.

(2) W. M., 30 anos, caboclo, comunidade do km 13 do Ramal da Morena, membro do MAB/AM, pesquisa de campo, 2009. In RODRIGUES, Renan Albuquerque. Vidas despedaçadas: impactos socioambientais da construção da Hidrelétrica de Balbina (AM), Amazônia Central. Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia, 2013, Ufam.

Renan Albuquerque é professor e pesquisador do colegiado de jornalismo da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e desenvolve estudos relacionados a conflitos e impactos socioambientais entre índios waimiri-atroari, sateré-mawé, hixkaryana, junto a atingidos pela barragem de Balbina e com assentados da reforma agrária.

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Reportagem Noticiosa

Sobre a matéria

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