Economia e Negócios

Vendedores autônomos sofrem despejo da Praça dos Bois em Parintins

Por Gabriel Ferreira Publicado em: 19/12/2021 às 17:53

Prefeitura de Parintins removeu 21 famílias do local sob a justificativa de abrir espaço para a construção de um anfiteatro.

Manaus (AM) – Cerca de 21 famílias de trabalhadores autônomos foram despejadas da área central da Praça dos Bois, no município de Parintins, por ordem do prefeito Frank Bi Garcia (União Brasil). A notificação de desocupação do local ocorreu no início do mês de novembro, mesmo após o pagamento de alvará de funcionamento dos estabelecimentos, de vendas de bebidas e alimentação.

De acordo com os vendedores autônomos, desde 2017 a prefeitura ameaçava-os de despejo. A maioria deles trabalhava na praça desde 2005, mas exerciam a atividade comercial sem licitação. Somente no ano de 2013 a prefeitura de Parintins, na gestão de Alexandre da Carbrás, regulamentou a atividade comercial da área, que só era realizada durante a noite.

No dia 9 de novembro, foi realizada uma reunião entre o prefeito em exercício de Parintins Mateus Assayag, o secretário de Terras, Cadastros e Arrecadação, Sérgio Cardoso, e os permissionários do local. No encontro, não houve definição de um novo espaço destinado aos trabalhadores, nem proposta de indenização. De acordo com o executivo municipal, a determinação para realocação será por meio do setor de Terras do Município.

A prefeitura, comunicado, informou que a retirada dos vendedores autônomos é justificada para construção do Anfiteatro, um espaço destinado a quadrilhas, danças, bois em miniatura, bois mirins, pastorinhas e outros segmentos da cultura. Foi dada a ordem de serviço para execução de obra no sábado (20), com custo de 3 milhões de reais. O espaço terá capacidade para 5 mil pessoas e tem previsão de entrega para julho de 2022.

Entre os despejados pela prefeitura, está a vendedora Maria Joana Assunção, de 56 anos, que durante 7 anos trabalhou no local com a venda de alimentação e bebida, principalmente nos eventos festivos. A renda diária na faixa de 200 reais era a única forma da família de nove filhos, onde quatro ainda moram na mesma casa com a trabalhadora autônoma.

A representante dos vendedores autônomos despejados também lamentou ver tudo desmoronar, pois ali na praça resistia a memória e o sonho do filho Jardel Assunção de Almeida. Idealizador do trailer de ferro para venda de alimentos e bebidas na praça, no ano de 2015, aos 27 anos ele foi assassinado em Manaus. “Esse lanche é uma herança de um filho que deixou pra mim, ele morreu. Ele lutou pra conseguir esse lanche para trabalhar, ele voltou pra Manaus pra trabalhar e ampliar. Ele disse: ‘Mãe, eu vou trabalhar, e em dezembro eu volto”, relatou.

Sobre a ordem de despejo, Maria Joana declarou que a notificação ocorreu “não de forma judicial”, assim como não houve assistência de transporte ou financeira pela prefeitura.

De acordo com ela, foi dado o prazo de sete dias para retirada das bancas e trailer, pois se houvesse resistência o prefeito Bi Garcia daria ordem para retirada com tratores. A comerciante também relatou que os vendedores evitavam a subutilização do local para zona de consumo de drogas e assaltos. A área também servia para guardar as alegorias do Boi Bumbá Garantido durante o mês de junho no Festival de Parintins.

Maria Joana e Jardel (Foto: Reprodução redes sociais)

“Segundo o prefeito, ele quer construir um anfiteatro, pra ficar que nem o Bumbódromo, só funciona de ano em ano, porque o Bumbódromo só funciona aqui de ano em ano, e quando tem alguns eventos. Tudo que nós não queríamos era isso, ficar no relento, jogado a ver navios, sem ter condições pra nada”, contou Maria Joana.

Além disso, a vendedora relatou que a situação dos vendedores despejados “está terrível, está desumano”, pois até o momento não houve orientação de um novo local e toda área foi desocupada pelos vendedores.

Conforme Maria Joana, os impactos causados pelo despejo, “é a falta de respeito, que nós não temos condições, era daqui que a gente sobrevivia, era daqui que a gente tirava o nosso pão de cada dia, o alimento, pagar nossas dívidas. Na pós-pandemia, a maioria não tem condições, não tem mesmo, porque não trabalhou na pandemia. Estamos sofrendo com a situação”.

Assistência da Defensoria

A defensora pública Enale Coutinho (Foto reprodução redes sociais)

No dia 17 de novembro, os vendedores autônomos despejados foram atendidos em audiência pela Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM). A reunião foi realizada na sede do órgão, em Parintins.

“A gente fez o atendimento dos prejudicados. De fato, é uma questão discricionária do poder público. Mas a gente oficiou de qualquer forma pra pedir esclarecimentos e verificar quais são as providências que estão sendo tomadas”, disse a defensora Enale Coutinho. Segundo ela, o executivo municipal informou que a obra deve ser concluída ao final de 2022 e que há um projeto para realocação para 18 permissionários afetados.

Enale Coutinho defende a mobilização dos trabalhadores despejados, pois “às vezes, acabam ficando ou com medo, com falta de mobilização, então até judicialmente fica difícil fazer qualquer coisa”.

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Reportagem Noticiosa

Sobre a matéria

Citações

“Esse lanche é uma herança de um filho que deixou pra mim, ele morreu. Ele lutou pra conseguir esse lanche pra trabalhar, ele voltou pra Manaus pra trabalhar e ampliar. Ele disse, mãe eu vou trabalhar, e em dezembro eu volto”, relatou a vendedora Maria Joana Assunção, de 56 anos, mãe de Jardel Assunção de Almeida, que comprou o trailer.

Links: https://parintins.am.gov.br/?q=277-conteudo-103836-para-construcao-de-anfiteatro-lanchonetes-da-parte-central-da-praca-dos-bois-serao-realocadas-em-outra-area%C2%A0

https://parintins.am.gov.br/?q=277-conteudo-103849-bi-garcia-assina-ordem-de-servico-para-construcao-de-anfiteatro-na-praca-dos-bois

https://parintins.am.gov.br/

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Manaus

Gabriel Ferreira

Gabriel Ferreira é jornalista parintinense, mestrando no Programa de Pós-Graduação Sociedade e Cultura na Amazônia( PPGSCA/ Ufam). Trabalhou como repórter do caderno de esportes Craque do Jornal A Crítica e foi colaborador da Rede de Notícias da Amazônia (RNA). É colaborador da Amazônia Real e também escreve para os sites BNC Amazonas e Ecoa/UOL.

1 Comentário

Rosa Maria disse:

03/08/2022 às 06:36

Ótima reportagem. Que bom que temos meios de comunicação sérios. Parabéns. Parintins precisa de um jornalismo sério e responsável.

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