Política

Movimento parou trânsito para pressionar por CPI da Pedofilia

ENTREVISTA O 9 de abril foi um dia decisivo para os representantes das 34 organizações que compõe o Movimento Amazonas Contra a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes e a Corrupção (Mapec) na pressão pela abertura da CPI da Pedofilia […]

Por Kátia Brasil Publicado em: 18/04/2014 às 01:52

ENTREVISTA

O 9 de abril foi um dia decisivo para os representantes das 34 organizações que compõe o Movimento Amazonas Contra a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes e a Corrupção (Mapec) na pressão pela abertura da CPI da Pedofilia na Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam). Segundo o psicólogo e membro do Mapec, Alberto Jorge Silva (foto acima), os representantes fizeram um protesto e fecharam, parcialmente, a via principal de acesso a sede da Casa.

Segundo ele, o presidente e deputado Josué Neto (PSD) se recusava a receber os representantes do movimento para conversar sobre a morosidade na abertura da CPI, que seria instalada depois das eleições de 03 de outubro, como queria a base governista.

“No final do dia, Josué Neto acabou anunciando a abertura da comissão para investigar os crimes de exploração sexual infanto-juvenil e a pedofilia em todos municípios do Amazonas”, disse Silva.

Alberto Jorge Silva é também coordenador geral da Aratrama (Articulação Amazônica dos Povos Tradicionais de Matriz Africana) e conselheiro estadual de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente dos Povos e Comunidades Tradicionais do Amazonas. Ele conta, nessa entrevista à agência Amazônia Real, como o movimento vai acompanhar a investigação dos deputados estaduais.

Qual é a expectativa do Mapec diante das manobras que os deputados fizeram para não instalar a CPI da Pedofilia na Assembleia Legislativa?

Olhamos com muita preocupação toda essa manobra espúria por parte da Aleam. Temos consciência de que foi por pura pressão das 34 Organizações da Sociedade Civil que compusemos o Movimento Amazonas Contra a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes e a Corrupção (Mapec-AM), no momento em que fomos tratados sem o menor respeito pelo presidente da Aleam, deputado Josué Neto. Ele não quis conversar conosco, mesmo tendo nos convidado a ir ao seu gabinete, e nos deixado esperando por mais de três horas, alegando que só falava com quem ele quisesse.

Diante dessa resposta nós fizemos um manifesto na quarta-feira (9 de abril). Durante três horas na avenida Recife, em frente a Aleam, paramos parcialmente o trânsito já caótico, o que gerou “buzinaço” dos motoristas.

Fomos chamados para uma conversa com o deputado Josué Neto, que mais uma vez foi mal educado se retirando da sala quando as falas dos representantes de Movimentos Sociais não lhe agradaram. No entanto, nosso recado foi dado: ou os deputados instalavam imediatamente a CPI ou continuaríamos paralisando o trânsito. Nesse mesmo dia a CPI foi instalada, no entanto dentro dos parâmetros por eles impostos.

O que o Mapec tem a dizer sobre as participações na CPI da Pedofilia dos deputados Abdala Fraxe e Ricardo Nicolau, ambos acusados em processos criminais?

Não gostamos desses nomes, bem como a posição por eles ocupadas. Como confiar em quem desde o começo era contra a CPI? Mas o que pode fazer o movimento se eles estão respaldados pelo regimento interno da Casa? Só nos resta acompanhar de perto cada passo da CPI. O jogo está muito sujo. Prova disso são as calúnias e injúrias contra o deputado estadual Luiz Castro (PPS). Estão cometendo verdadeiros absurdos, inventando coisas sem a menor procedência.

Chega a causar náusea a maneira descarada com que certos deputados usam da tribuna para praticar tamanha vilania. Temos consciência de que a luta só está no começo, que precisaremos ter muita coragem e determinação para não deixar que essa coisa acabe do mesmo jeito de outras CPIs.

Sabemos que cada uma das lideranças está correndo sérios riscos de ser vilipendiada a torto e a direita, que nossas seguranças estão ameaçadas, mas esse é o preço da militância. É senso comum de que não é apenas a pedofilia que está em jogo, é todo um esquema imenso de corrupção dominante que está calando, obserquiosamente, muita gente que poderia de fato já ter colocado um ponto final nesses crimes.

Como o senhor analisa o silêncio das autoridades e de entidades da sociedade civil com relação aos crimes contra as crianças e adolescentes no Amazonas?

Vemos que há um silêncio obsequioso de várias entidades de peso no Estado. Os partidos políticos em quase sua totalidade estão sendo indiferentes. Um exemplo gritante disso é o PC do B. A senadora Vanessa Grazziotin está muda e calada. Por que? O Senador Eduardo Braga, PMDB, líder do Governo no Senado é um que andava de braços dados com Adail Pinheiro e o tem como aliado político.

Pelo mesmo caminho se conduz o senador Alfredo Nascimento (PR). Vários deputados federais como Átila Lins (PSD) e Sabino Castelo Branco (PTB) que até discursos já fizeram anunciando a volta vitoriosa de Adail Pinheiro para a prefeitura de Coari. O que está por trás de todo esse apoio? De todo esse silêncio obsequioso? Só pode ser alguma coisa muita suja, corrupta, pois não se exporiam assim a troco de nada.

Há o silêncio de organizações como a UNICEF, o CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas), a Fieam (Federação das Indústrias do Estado do Amazonas), a Ordem dos Ministros Evangélicos do Amazonas, a atuação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) está a quase zero. A posição da própria Arquidiocese de Manaus é muito tímida. Todos condenam à boca pequena, mas não se colocam publicamente, não estão empunhando a bandeira. O clima é de silêncio. Penso que no momento em que o judiciário do Amazonas se corrompeu, e quem afirma isso é CNJ, muita gente se acovardou ou chegou à conclusão de que é inútil lutar.

Como o Mapec vai trabalhar para que as crianças e adolescentes não sejam corrompidas e ameaçadas por acusados?

Teremos que avaliar isso com muito cuidado. Na semana que vem teremos uma reunião de avaliação criteriosa para vermos os passos que precisamos dar. Volto a repetir que estamos lutando contra um gigante corrupto, que dispõe de muito dinheiro, força, violência e poder.

Alberto Jorge e Lucimar Weil (do Cedeca) no protesto de rua (Foto: arquivo pessoal)

Em 2004, o ex-governador Omar Aziz (PSD) foi inocentado pela CPI do Congresso e pela CPI da Aleam. Segundo o então senador Arthur Virgílio Neto (PSDB), seria um irmão o responsável pelo abuso de uma menina. Só que este irmão nunca foi investigado.

Aqui nessa terra quem tem dinheiro, força política e poder de mídia tudo pode. Há muitas coisas que nunca chegaram e nem vão chegar ao conhecimento do público. Há muitos esquemas e podridões que, quem sabe daqui a 50 anos venham à tona, mas por hora ficarão no silêncio ou no esquecimento obsequioso. Esse caso envolvendo os Aziz é algo que exige uma resposta, que o Omar em sendo um homem que quer ser senador da República tem o dever de querer a coisa bem explicada, investigada, para que o nome de sua família não fique sob suspeita enquanto isso não for bem esclarecido. Até mesmo para que possa fazer um trabalho com dignidade no Senado Federal. Mas há honra e honra!

Para alguns ter um caso de pedofilia impune em família é algo que pode ficar no esquecimento, para outros não. Tudo vai depender do que se entende por honra, por ética, por moral.

Sinto que no Amazonas a corrupção se tornou algo politicamente cultural, o conchavo político é a tônica. A falta de respeito por si e pelos outros é total. Carecemos de fato de bons políticos e o que se tem como maioria, até o presente momento, já demonstrou não ter vergonha na cara, mandaram a ética e a moral para o balatal (como diziam os antigos) há muito tempo.

Lamento em dizer que deixei de acreditar em Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM) como exemplo de política ética faz um bom tempo, em nada difere dos políticos profissionais de outros partidos. Seus métodos falam por si. Votei nele para prefeito e fiz campanha a seu favor por protesto contra Vanessa Grazziotin que rasgou sua história de vida política ao se sujeitar ao jogo espúrio da eleição municipal de Manaus. Vejo o escambo de votos que quase cem por conto dos políticos amazonense fazem com as igrejas evangélicas.

Assim como Arthur é Eduardo Braga, Omar Aziz, Vanessa Grazziotin entre outros. Ferem a laicidade do Estado como se isso fosse a coisa mais comum do mundo, da forma mais desavergonhada. Esse é só um pequeno exemplo.

Cada vez mais se confirma a máxima de que em política não há amigos que não se tornem inimigos e nem há inimigos que não possam compactuar. O que vale é o voto. Mas não creio que dessa vez, com a CPI da Pedofilia acompanhada de perto pelos Movimentos Sociais, fiquemos sem resultados efetivos. Há políticos e grupos empresariais de comunicação que estão se matando, se destruindo publicamente e isso ainda promete continuar por um bom tempo e vamos apostar que essa briga traga a lume novos dados concretos desse mar de lama.

A pedofilia é apenas a ponta visível desse iceberg. De certo será um grande teste para os Movimentos Sociais comprometidos com a verdade. Francamente não saberia responder quantas lideranças dos Movimentos Sociais conseguirão se manter coerentes com a bandeira de luta que estamos empunhando, mas é preciso tentar.

Agora é esperar que o Povo acorde e deixe de se prostituir por migalhas. Se Adail Pinheiro chegou onde chegou é porque o povo de Coari se deixou comprar por migalhas, se prostituiu em troca de vinténs que sobraram dos milhões que lhes era devido por conta dos royalty do petróleo.

É hora do povo do Amazonas acordar e pôr fim a essa oligarquia infame instalada no poder há décadas, só não creio que isso se dê agora em 2014.

Reportagem Noticiosa

Sobre a matéria

Kátia Brasil

Kátia Brasil é co-fundadora e editora executiva da agência de jornalismo independente e investigativo Amazônia Real, com sede em Manaus (AM). Recém formada pela Faculdade Hélio Alonso, no Rio de Janeiro, foi morar na Amazônia no início do ano de 1990. Trabalhou na TV Cultura e jornais O Globo, A Gazeta de Roraima, O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo. Entre os prêmios que ganhou estão o Esso Regional Norte 1991 e Women Journo Heroes (#JournoHeroes), da International Women’s Media Foundation (IWMF), em 2019, Prêmio Abraji, em 2020, Vladimir Herzog e Comunique-se, ambos em 2021. É uma das jornalistas brasileiras +Admiradas Negras da Imprensa Brasileira, em 2024. É diretora editorial do Projor/Observatório da Imprensa. Conselheira do Tornavoz e RBJA, e membra da Comissão da ABI Ambiental. Foi eleita em 1o. lugar Região Norte do Prêmio TOP 100 +Admirados Jornalistas Brasileiros. Integra o forbiddenstories.org, o Fórum Permanente das Mulheres de Manaus (FPMM) e o Coletivo Mães Pela Diversidade em defesa das pessoas LGBTQIAPN+. ([email protected])

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1 Comentário

Alberto Jorge Silva disse:

20/04/2014 às 14:05

Disse o que penso, sem medo de ser feliz ou de ferir suscetibilidades.
Quem não gostar que faça por onde não receber críticas.
Cumpro com o meu papel social, doa a quem doer.

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